Um concílio é
uma reunião de autoridades eclesiásticas para deliberar sobre questões
relacionadas à fé.
A história da
igreja cristã nos mostra que vários concílios aconteceram do decorrer dos
tempos, tanto no meio católico como no meio protestante. No meio católico, por
exemplo, já se contabilizam 21 concílios.
Estes
concílios foram, e são até hoje, motivos de muitas discussões no meio
eclesiástico, e em uma análise crítica desses concílios, vamos ver que alguns
foram realizados apenas para contradizer outros anteriores.
No entanto
muito pouco tem sido dedicado ao estudo do que aconteceu no primeiro concílio
da Igreja Cristã. Não estou me referindo ao concílio de Níceia (em 325 d.C.),
eu me refiro ao concílio de Jerusalém descrito em Atos 15.
Esse concílio
possui algumas características que deveriam fazer qualquer cristão se debruçar
sobre ele em estudo sincero. Primeiro porque foi o único concílio presidido e
com participação ativa dos apóstolos de Cristo; segundo porque é o único
concílio que é canônico, ou seja, faz parte da bíblia.
Vamos
analisar o registro desse concílio?
“Então alguns que tinham descido da Judéia ensinavam assim os irmãos:
Se não vos circuncidardes conforme o uso de Moisés, não podeis salvar-vos. Tendo
tido Paulo e Barnabé não pequena discussão e contenda contra eles, resolveu-se
que Paulo e Barnabé, e alguns dentre eles, subissem a Jerusalém, aos apóstolos
e aos anciãos, sobre aquela questão.
E eles, sendo acompanhados pela igreja, passavam pela Fenícia e por
Samaria, contando a conversão dos gentios; e davam grande alegria a todos os
irmãos. E, quando chegaram a Jerusalém, foram recebidos pela igreja e pelos
apóstolos e anciãos, e lhes anunciaram quão grandes coisas Deus tinha feito com
eles.
Alguns, porém, da seita dos fariseus, que tinham
crido, se levantaram, dizendo que era mister circuncidá-los e mandar-lhes que
guardassem a lei de Moisés.
Congregaram-se, pois, os apóstolos e os anciãos para considerar este
assunto.” Atos 15:1-6
O problema
que motivou esse concílio foi a questão dos gentios que estavam se convertendo
à Deus por meio de Cristo. Quando a Igreja foi inaugurada em Pentecostes, através da pregação de
Pedro, onde três mil almas foram batizadas, daquele momento até a conversão do
centurião Cornélio, descrito em Atos 10, a igreja era formada em sua totalidade
por judeus ou prosélitos.
Ou seja, nos
primeiros dez anos da igreja, ela era formada apenas por judeus ou pessoas
convertidas ao judaísmo, que haviam reconhecido Jesus Cristo como o Messias
prometido a Israel. Não havia nem um único membro da Igreja de Cristo que não
estivesse dentro do contexto judaico.
Vemos que
quando o Espírito Santo vem sobre Cornélio e sua família, assim como havia sido
sobre os apóstolos no dia de Pentecostes, tanto Pedro como os que o
acompanhavam ficaram maravilhados que os gentios também estavam recebendo a
promessa.
“E os fiéis que eram da circuncisão,
todos quantos tinham vindo com Pedro, maravilharam-se de que o dom do Espírito
Santo se derramasse também sobre os gentios.” Atos 10:45
E quando
Pedro retornou a Jerusalém, comunicando aos demais apóstolos e discípulos de
Cristo que os gentios também haviam recebido o dom do Espírito Santo, todos
ficaram espantados com a notícia, e até aquele momento os discípulos anunciavam
a Cristo unicamente aos judeus, mas devido àquela noticia, passaram também a
anunciar a Cristo aos gentios, e em Antioquia se estabeleceu a primeira igreja
gentílica da história.
“E, ouvindo estas coisas, apaziguaram-se, e glorificaram a Deus,
dizendo: Na verdade até aos gentios deu Deus o arrependimento para a vida. E os
que foram dispersos pela perseguição que sucedeu por causa de Estêvão
caminharam até à Fenícia, Chipre e Antioquia, não anunciando a ninguém a
palavra, senão somente aos judeus. E havia entre eles alguns homens chíprios e
cirenenses, os quais entrando em Antioquia falaram aos gregos, anunciando o
Senhor Jesus.” Atos 11:18-20
Foi
justamente na igreja de Antioquia que temos o relato do inicio do capitulo 15
de Atos. Alguns fariseus convertidos
a Cristo saíram de Jerusalém, ensinando que os gentios deveriam ser
circuncidados para serem salvos. Paulo e Barnabé se opuseram fortemente a esses
fariseus, e havendo grande contenda, resolveram subir aos apóstolos para levar
essa questão.
Assim vamos
ver que a motivação do concílio de Jerusalém era sobre a necessidade de os
gentios se converterem ao judaísmo para serem salvos, ou se como gentios eles
poderiam ser alcançados pela graça de Deus.
A circuncisão
aqui não é apenas uma questão de obedecer ou não aos mandamentos, mas a
circuncisão estipulada por Deus em Genesis 17:11, é a marca de identidade aos
filhos de Abraão, e sinal de aliança entre Deus e os filhos de Israel.
Em nenhum
momento a Torá ordena a circuncisão dos gentios, mas todos aqueles que queriam
se converter ao judaísmo deveriam ser circuncidados. Assim a discussão estava
entre a necessidade de se tornar judeu para ser salvo. Esse era o ponto que
levou ao concílio de Jerusalém.
Paulo e
Barnabé começaram anunciando como os gentios estavam se convertendo a Deus
através da fé em Cristo, não tendo a necessidade de se tornarem judeus, mas
mantendo a sua identidade gentílica.
Os fariseus
então rebatem dizendo que era necessário torná-los circuncisos na carne para
que fossem salvos plenamente, e nesse momento Pedro pede a palavra e começa com
seu relato onde diz:
“E, havendo grande contenda, levantou-se Pedro e disse-lhes: Homens
irmãos, bem sabeis que já há muito tempo Deus me elegeu dentre nós, para que os
gentios ouvissem da minha boca a palavra do evangelho, e cressem. E Deus, que
conhece os corações, lhes deu
testemunho, dando-lhes o Espírito Santo, assim como também a nós; e não fez
diferença alguma entre eles e nós, purificando os seus corações pela fé.
Agora, pois, por que tentais a Deus, pondo sobre a cerviz dos discípulos
um jugo que nem nossos pais nem nós pudemos suportar? Mas cremos que seremos salvos pela graça do Senhor Jesus Cristo, como
eles também.
Então toda a multidão se calou e escutava a Barnabé e a Paulo, que
contavam quão grandes sinais e prodígios Deus havia feito por meio deles entre
os gentios.” Atos 15:7-12
Em seu
discurso Pedro elenca alguns pontos importantes, primeiro que foi o próprio
Deus quem deu testemunho daqueles gentios que haviam recebido pela fé a Cristo,
batizando-os com o Espírito Santo da promessa.
O Espírito
Santo foi outorgado pelo próprio Pai a aqueles que eram incircuncisos, mas que
pela fé haviam se convertido a Deus, alcançando bom testemunho até mesmo entre
os judeus como foi o caso de Cornélio (At 10:22).
Assim quem
estava demonstrando que a salvação estava ao alcance dos gentios era o próprio
Deus, que havia dado do seu Espírito tanto a judeus como a gentios, não fazendo
distinção entre eles.
Diante desse
testemunho do próprio Deus, como poderiam tentar a Deus?
Pedro diz que
aqueles fariseus estavam querendo colocar um peso sobre os discípulos que nem
eles, nem os pais podiam suportar, e esse peso que Pedro estava se referindo é
o legalismo da obediência aos mandamentos para a salvação.
Pedro estava
dizendo que mesmo eles que eram circuncidados, tinham a esperança da salvação
não na prática da Lei, mas na fé em Jesus Cristo.
De fato,
buscar a salvação por méritos próprios é um peso que ninguém consegue suportar,
porque somos todos pecadores. Paulo havia chamado a atenção de Pedro sobre essa
questão conforme vemos registrado em Gálatas:
“Mas, quando vi que não andavam bem e direitamente conforme a verdade
do evangelho, disse a Pedro na presença de todos: Se tu, sendo judeu, vives
como os gentios, e não como judeu, por que obrigas os gentios a viverem como
judeus? Nós somos judeus por natureza, e não pecadores dentre os gentios. Sabendo que o homem não é justificado pelas
obras da lei, mas pela fé em Jesus Cristo, temos também crido em Jesus Cristo,
para sermos justificados pela fé em Cristo, e não pelas obras da lei;
porquanto pelas obras da lei nenhuma carne será justificada.” Gálatas 2:14-16
Mesmo sendo
eles judeus por natureza, ou seja, mesmo tendo desde a infância o conhecimento
da Lei, mesmo praticando a Lei e andavam de maneira correta, não em
prostituição e idolatria como os gentios, eles estavam depositando em Jesus
Cristo a sua fé para a justificação e não em suas obras, pois sabiam que pelas
obras da Lei ninguém seria justificado.
Assim o
primeiro ponto que vemos bem estabelecido neste concílio é a salvação pela Fé
em Cristo e não no legalismo e obras. Então Tiago toma a palavra e começa a
expor suas conclusões que resultaram no texto final deste concílio.
Tiago levanta
uma questão importante que tem sido pouco compreendida pela igreja moderna, ele
relaciona a conversão dos gentios a Cristo com a palavra do profeta Amós, e
cita sobre a restauração do Tabernáculo de Davi:
“E, havendo-se eles calado, tomou Tiago a palavra, dizendo: Homens
irmãos, ouvi-me:
Simão relatou como primeiramente Deus visitou os gentios, para tomar
deles um povo para o seu nome. E com isto concordam as palavras dos profetas;
como está escrito:
Depois disto voltarei, e reedificarei o tabernáculo de Davi, que está
caído, levantá-lo-ei das suas ruínas, e tornarei a edificá-lo. Para que o
restante dos homens busque ao Senhor,e todos os gentios, sobre os quais o meu
nome é invocado, diz o Senhor, que faz todas estas coisas, conhecidas são a
Deus, desde o princípio do mundo, todas as suas obras.” Atos 15:13-18
Segundo
Tiago, e de acordo com os profetas, a conversão dos gentios está relacionada à
reedificação do “tabernáculo de Davi”. O que podemos entender por “tabernaculo
de Davi” senão a restauração do Reino de Israel.
A esperança
da restauração do Reino de Israel sempre esteve no coração dos apóstolos, e
como conhecedores das profecias chegaram até a indagar o Mestre se seria
naquele tempo em que essa promessa se cumpriria (At 1:6).
Mas porque os
apóstolos e discípulos de Jesus, que o tinham visto ressurreto, e o ouviram
anunciar a vinda do Reino dos Céus estariam ainda preocupados com a restauração
do reino de Israel?
Vamos ver
duas profecias que estão registradas no evangelho de Lucas, sendo uma delas
anunciada pelo anjo Gabriel e a outra pronunciada por Simeão, pai de Gamaliel,
e filho de Hilel, onde diz a respeito de Jesus:
“Este será grande, e será chamado filho do Altíssimo; e o Senhor Deus lhe dará o trono de Davi,
seu pai; e reinará eternamente na casa
de Jacó, e o seu reino não terá fim.” Lucas 1:32-33.
“Ele, então, o tomou em seus
braços, e louvou a Deus, e disse: Agora, Senhor, despedes em paz o teu servo,
Segundo a tua palavra; pois já os meus olhos viram a tua salvação, a qual tu
preparaste perante a face de todos os povos; Luz para iluminar as nações, e
para glória de teu povo Israel.” Lucas 2:28-32
A restauração
do Reino de Israel está intimamente ligada à restauração de todas as coisas. Vemos
pelas profecias que Cristo voltará para seu povo Israel, e reinará sobre
Jerusalém por mil anos.
Cristo virá
para Reinar em Jerusalém, por mil anos se assentará no trono de Davi, (Ap 20:6)
e regerá as nações com vara de ferro (Ap 2:27, 12:5), e todas as nações irão a
Jerusalém para adorar (Zc 14:16-17), até que se completem os mil anos, e então satanás
será solto uma ultima vez e enganará as nações, Gogue e Magogue se levantará
contra Israel uma ultima vez e Cristo vencerá e lançara satanás e todos seus
seguidores do lago de fogo (Ap 20:7-10), e fará o juízo final (Ap 20:11-15).
Israel é o
centro das profecias bíblicas, Jesus mesmo disse para observarmos a figueira, e
ainda disse que voltaria quando Israel clamasse por Ele (Mt 23:39).
Daniel também
nos mostra isso onde está escrito:
“Setenta semanas estão determinadas sobre o teu povo, e sobre a tua santa cidade, para cessar a
transgressão, e para dar fim aos pecados, e para expiar a iniquidade, e trazer
a justiça eterna, e selar a visão e a profecia, e para ungir o Santíssimo.”
Daniel 9:24
Israel tem um
papel importantíssimo na redenção universal (Rm 8:19-25), e essa redenção se
dará no contexto do reino milenar, por isso os apóstolos tinham a expectativa
da restauração do reino. Quando lemos Isaías 11 e Isaías 65, temos o retrato
perfeito do que será o milênio.
O milênio
será o período da restauração de todas as coisas que repetidas vezes foi
apontada no novo testamento (At 3:21; Ef 1:9-10; Rm 8:19)
Assim o
segundo ponto que é bem estabelecido no concílio de Jerusalém é a expectativa
da restauração do Reino de Israel, sabendo da importância que tem Israel no
contexto histórico e profético das escrituras.
Tiago ainda
continua com sua conclusão e termina propondo o seguinte:
“Por isso julgo que não se deve perturbar aqueles, dentre os gentios,
que se convertem a Deus. Mas escrever-lhes que se abstenham das contaminações
dos ídolos, da fornicação, do que é sufocado e do sangue. Porque Moisés, desde os tempos antigos, tem em cada cidade quem o
pregue, e cada sábado é lido nas sinagogas.” Atos 15:19-21
A proposta de
Tiago era não impor sobre os cristãos gentios a obrigatoriedade da Lei, mas
estabelecer quatro preceitos básicos apenas, pois se aqueles gentios estavam
sendo alcançados pelo amor de Deus, e depositando sua fé em Cristo, também pela
mesma fé, iriam obedecer aos mandamentos conforme tomassem consciência deles.
Por isso
Tiago ressalta no final que “Moisés (a
Lei), desde os tempos antigos, tem em cada cidade quem o pregue, e cada sábado
é lido nas sinagogas”.
Assim, os
gentios são incentivados a aprenderem mais sobre a Torá (a Lei). Sendo que a obediência
à Lei não deveria em hipótese alguma ser fruto de legalismo para justificação
por obras, mas sim pela fé em Deus, e pelo entendimento da Palavra de Deus.
Isso não quer
dizes que devemos colocar os mandamentos em segundo plano, muito pelo
contrário, como cristãos fiéis devemos procurar conhecer a Lei e nos sujeitar à
ela com entendimento e por meio da fé, assim como Paulo diz em Romanos:
“Anulamos, pois, a lei pela fé? De maneira nenhuma, antes estabelecemos
a lei.” Romanos 3:31
Chegamos
então ao texto final da conclusão do concilio que, como cristãos, devemos ter
como Lei para nós:
“E por intermédio deles escreveram o seguinte: Os apóstolos, e os
anciãos e os irmãos, aos irmãos dentre os gentios que estão em Antioquia, e
Síria e Cilícia, saúde.
Porquanto ouvimos que alguns que saíram dentre nós vos perturbaram com
palavras, e transtornaram as vossas almas, dizendo que deveis circuncidar-vos e
guardar a lei, não lhes tendo nós dado mandamento, pareceu-nos bem, reunidos
concordemente, eleger alguns homens e enviá-los com os nossos amados Barnabé e
Paulo, homens que já expuseram as suas vidas pelo nome de nosso Senhor Jesus
Cristo. Enviamos, portanto, Judas e Silas, os quais por palavra vos anunciarão
também as mesmas coisas.
Na verdade pareceu bem ao Espírito Santo e a nós, não vos impor mais
encargo algum, senão estas coisas necessárias:
Que vos abstenhais das coisas sacrificadas aos ídolos, e do sangue (assassinato, maledicência), e da carne
sufocada (ingestão de sangue), e da
fornicação, das quais coisas bem fazeis se vos guardardes. Bem vos vá.” Atos
15:23-29
Atualmente a
igreja cristã se divide em duas situações opostas às determinações desse
concílio. Há aqueles que buscam sua justificação em suas obras, creem que serão
salvos por não fazer isso ou aquilo, ou por se penitenciarem. Creem que serão
justificados através das horas e mais horas de orações, rezas, jejuns e etc.
Outro grupo
bastante distinto crê que são justificados unicamente por crer, ou por ter
feito alguma confissão publica de fé em Cristo, e não tem nenhuma preocupação
em conhecer e sujeitar-se às Leis de Deus.
Ambos estão em total desacordo com o que foi determinado
pelo concilio apostólico. O que aprendemos nas determinações deste concílio é
que a salvação é sim unicamente pela Fé que temos em Cristo como o Filho de
Deus.
Não há como
através de nossas obras sermos justificados diante de Deus por um motivo muito
simples que o mesmo Tiago que presidiu este concílio também explica:
“Porque qualquer que guardar toda a lei, e tropeçar em um só ponto,
tornou-se culpado de todos.” Tiago 2:10
Assim, a
salvação e o perdão de nossos pecados são mediante ao que Cristo fez por nós na
cruz, e não por nossas obras.
No entanto
essa mesma Fé que me aproxima de Deus também deve me levar à fidelidade à sua
Palavra:
“Mas dirá alguém: Tu tens a fé, e eu tenho as obras; mostra-me a tua fé
sem as tuas obras, e eu te mostrarei a minha fé pelas minhas obras.” Tiago 2:18
E os
apóstolos não nos deixaram sem Lei, mas determinaram quatro princípios básicos
que devemos observar com precisão: Não nos contaminar com a idolatria (o
que engloba várias práticas consideradas pagãs pela Torá), não nos
contaminarmos com as imoralidades sexuais (adultério, defraudação, prostituição, etc)
do sangue (assassinato, maledicência) e da carne sufocada (ingestão
de sangue).
Assim, como
cristãos devemos estar atentos à nossa fé em Cristo, e por meio dessa fé
devemos conhecer os mandamentos e procurar obedecê-los.
obrigado pela matéria, vou lê-la com atenção! que Cristo continue te abençoando! seu esforço eh muito bem visto pelo Senhor! Hugo
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