O fim da Lei é Cristo?

“Porque o fim da lei é Cristo para justiça de todo aquele que crê.
Ora, Moisés descreve a justiça que é pela lei, dizendo: O homem que fizer estas coisas viverá por elas. Mas a justiça que é pela fé diz assim: Não digas em teu coração: Quem subirá ao céu? (isto é, a trazer do alto a Cristo.) Ou: Quem descerá ao abismo? (isto é, a tornar a trazer dentre os mortos a Cristo.) Mas que diz? A palavra está junto de ti, na tua boca e no teu coração; esta é a palavra da fé, que pregamos, a saber: Se com a tua boca confessares ao Senhor Jesus, e em teu coração creres que Deus o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo.” Romanos 10:4-9

Este texto de Romanos é usado por alguns para sustentar a ideia de que a Torá foi anulada por Cristo, e que os “cristãos” não devem mais se preocupar com a Torá, nem com sua prática.

Vamos analisar este texto de Paulo, e ver se realmente Paulo acreditava que os discípulos de Jesus poderiam dar as costas à Torá?

Paulo diz que “o fim da Lei é Cristo”, e poderia já começar explicando que a palavra “telos” no grego é usada como “finalidade” ou “objetivo” e não como “término”. Mas Paulo sustenta esse argumento de que “o fim da Lei é Cristo” com uma citação da Torá.  Paulo cita uma passagem muito interessante de Deuteronômios. Vamos ler o texto citado por Paulo como está na Torá:

“Porque este mandamento, que hoje te ordeno, não te é encoberto, e tampouco está longe de ti. Não está nos céus, para dizeres: Quem subirá por nós aos céus, que no-lo traga, e no-lo faça ouvir, para que o cumpramos? Nem tampouco está além do mar, para dizeres: Quem passará por nós além do mar, para que no-lo traga, e no-lo faça ouvir, para que o cumpramos? Porque esta palavra está mui perto de ti, na tua boca, e no teu coração, para a cumprires.” Deuteronômio 30:11-14

Adonai está exortando ao povo de Israel que os mandamentos ordenados na Torá (mandamentos que hoje te ordeno) não estão encobertos, ou seja, não estão em enigmas ou alegorias. Os mandamentos da Torá são literais, claros e inteligíveis ao povo que a recebeu.

Também estes mandamentos não estão longe, inacessíveis, pelo contrário, os mandamentos foram entregues por Deus à Israel, e o objetivo era que a Torá estivesse bem próxima dos israelitas, na boca e no coração, para cumprir.

“Porque esta palavra está mui perto de ti, na tua boca e no teu coração, para a cumprires”.

Devemos atentar para a citação de Paulo a esse texto, pois ele faz uma associação muito interessante. Ele faz alguns acréscimos, com o intuito de fazer com que os leitores entendessem a visão dele sobre esse texto, e o porque ele disse que “o fim da Lei é Cristo”.

“Quem subirá ao Céus? (isto é, trazer do alto a Cristo). Quem descerá ao abismo? (isto é, a tornar a trazer dentre os mortos a Cristo).”

Literalmente Paulo está associando Jesus à Torá, afirmando que Jesus é a Torá que se fez carne. João já havia declarado isso em seu evangelho quando disse:

“E o Verbo se fez carne, e habitou entre nós, e vimos a sua glória, como a glória do unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade” João 1:14.

A simples afirmação de que Jesus é a Torá que se fez carne já nos dá outra perspectiva sobre a premissa de que “o fim da Lei é Cristo”.  Mas ao final da citação Paulo faz mais um acréscimo, explicando o texto, ele diz:

“Mas que diz? A palavra está junto de ti, na tua boca e no teu coração; esta é a palavra da fé, que pregamos, a saber: Se com a tua boca confessares ao Senhor Jesus, e em teu coração creres que Deus o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo.” Romanos 10:8,9

Agora precisamos entender porquê Paulo fez essa citação, qual o ensino errado que Paulo estava combatendo para fazer essa citação. Paulo estava fazendo uma comparação entre o que ele chamava de “justiça que vem da Lei” com a “justiça que vem da fé”:

“Ora, Moisés descreve a justiça que é pela lei, dizendo: O homem que fizer estas coisas viverá por elas. Mas a justiça que é pela fé diz assim: ...”

Paulo estava combatendo a ideia legalista apregoada por alguns de que os gentios deveriam se tornar judeus, e obedecer todos os ritos da Torá para serem salvos. A “justiça que é pela Lei” consistia na obediência mecânica a todos os mandamentos com o objetivo de ser salvo por Deus, por meio das obras.

Em outras palavras, segundo esse falso ensino, se alguém cresse em Jesus, mas não se circuncidasse e procurasse praticar todos os ritos estabelecidos pela Torá, não seria salvo.

Em suas cartas Paulo vai combater esse ensino que estava sendo difundido por alguns no seio da Igreja, e ele faz isso demonstrando que esse nunca foi o ensino da Torá.

“Então alguns que tinham descido da Judéia ensinavam assim os irmãos: Se não vos circuncidardes conforme o uso de Moisés, não podeis salvar-vos.” Atos 15:1

A grande verdade é que a Torá nunca foi dada para salvação, ou para o perdão dos pecados. A Torá foi dada por vários motivos, mas em nenhum momento vemos a Torá como meio de Salvação.

A Torá, acima de qualquer coisa, foi dada para definir o que é pecado. Os mandamentos demonstram o que é, e o que não é pecado. Ela aponta para um caminho de justiça, ao qual, se Israel obedecesse aos mandamentos, andaria por caminhos de bênção e de vida. E se desobedecesse, andaria por caminhos de maldição e morte.

“Que diremos pois? É a lei pecado? De modo nenhum. Mas eu não conheci o pecado senão pela lei; porque eu não conheceria a concupiscência, se a lei não dissesse: Não cobiçarás.” Romanos 7:7

E não é segredo para ninguém que nem Israel, nem ninguém, exceto o Messias, foi perfeito diante da Torá.

A Torá nos trás a certeza de uma coisa: todos somos pecadores, e por isso há uma condenação sobre todos os homens.

Paulo reforça isso em vários momentos para combater o legalismo. A prática de ritos estabelecidos na Torá não pode prover a nós o perdão. O perdão dos pecados é, e sempre foi, mediante a Graça e Misericórdia de Adonai.

É certo que a Torá apresenta sacrifícios para expiação dos pecados, mas não eram os sacrifícios que garantiam o perdão, e sim o arrependimento do israelita. O rito sacrificial era apenas uma forma de instruir o israelita da necessidade de expiação, ou seja, alguém teria que pagar pelo preço do pecado para que o indivíduo pudesse ser perdoado.

Por isso encontramos nos profetas Adonai dizendo:

“De que me serve a mim a multidão de vossos sacrifícios, diz o Senhor? Já estou farto dos holocaustos de carneiros, e da gordura de animais cevados; nem me agrado de sangue de bezerros, nem de cordeiros, nem de bodes.

Quando vindes para comparecer perante mim, quem requereu isto de vossas mãos, que viésseis a pisar os meus átrios?

Não continueis a trazer ofertas vãs; o incenso é para mim abominação, e as luas novas, e os sábados, e a convocação das assembléias; não posso suportar iniqüidade, nem mesmo a reunião solene.” Isaías 1:11-13

A “justiça que vem da Lei” não é a justiça divina, mas uma “justiça” humana, na qual ninguém poderá ser justificado.

Então podemos concluir que Jesus morreu na cruz para livrar-nos da Lei? De maneira nenhuma!

A Torá é boa, ela apresenta a vontade de Deus para o homem. Mas ela não pode nos transformar porque estamos fragilizados por nossa natureza carnal. O que nos impede de viver corretamente diante da Torá é a nossa natureza carnal e corrompida, que é o pecado que habita em nosso interior.

“Porque bem sabemos que a lei é espiritual; mas eu sou carnal, vendido sob o pecado. Porque o que faço não o aprovo; pois o que quero isso não faço, mas o que aborreço isso faço. E, se faço o que não quero, consinto com a lei, que é boa.” Romanos 7:14-16

Então vamos perceber que, apesar de a Torá ter sido entregue mediante Moisés, a 1.500 anos antes de Jesus, ela ainda estava incompleta. Por isso mesmo Jesus disse:

“Não cuideis que vim destruir a lei ou os profetas: não vim abrogar, mas cumprir.” Mateus 5:17

No grego encontramos a palavra “plerusai” que foi traduzida por “cumprir” mas tem a ideia de “tornar pleno” ou de “completar”.

Jesus morreu na cruz para nos livrar de nossos pecados, e nos outorgar o Espírito Santo. A Nova Aliança prometida em Jeremias 31 é clara em afirmar que o seu propósito é que a Torá seja escrita em nosso interior, em nosso coração.

“Mas esta é a aliança que farei com a casa de Israel depois daqueles dias, diz o Senhor: Porei a minha lei no seu interior, e a escreverei no seu coração; e eu serei o seu Deus e eles serão o meu povo.” Jeremias 31:33

Por isso encontramos Paulo ensinando que:

“Porquanto o que era impossível à lei, visto como estava enferma pela carne, Deus, enviando o seu Filho em semelhança da carne do pecado, pelo pecado condenou o pecado na carne; para que a JUSTIÇA DA LEI SE CUMPRISSE EM NÓS, que não andamos segundo a carne, mas segundo o Espírito.” Romanos 8:3,4

O andar em carne, segundo a natureza carnal e corrompida, consiste em andar em desobediência à Torá, ou seja, em pecados. Mas o andar em Espírito consiste em ter a Torá escrita no coração, e vivermos a cada dia em novidade de vida!

“Porquanto a inclinação da carne é inimizade contra Deus, pois não é sujeita à lei de Deus, nem, em verdade, o pode ser.” Romanos 8:7

A “justiça que é pela fé” consiste não em uma prática mecânica dos mandamentos, mas na confiança na Graça e na Misericórdia de Deus, revelada de forma plena e abundante no sacrifício e na ressurreição de Jesus, o Messias de Israel. E por confiar na capacitação que vem do alto para compreender e praticar a Torá

Se cremos em Jesus, devemos crer que ele nos capacitará a vencermos as nossas inclinações carnais, mediante o seu Espírito. Devemos crer que ele perdoará nossos pecados quando desobedecermos algum mandamento. Mas isso nunca significará que seremos tolerantes com o pecado, mas procuraremos diligentemente a mortificação de nossas obras da carne, através do fruto do Espírito.

Como discípulos de Jesus nós devemos procurar com zelo o estudo das Escrituras, e com oração a compreensão dos mandamentos, para com fé praticá-los.

Por isso podemos concluir que, para nós que somos salvos pela fé no sacrifício do Messias de Israel, a Torá deve ter grande relevância, não para sermos salvos, mas porque somos salvos, e desejamos viver em justiça, não a justiça legalista, mas a justiça que vem da fé.

Comentários

  1. Para sermos salvos precisamos aceitar a Graça de Jesus, o Sacrificio de Jesus na Cruz, ter Fé e fazer boas Obras Se amamos a Jesus, guardemos, obedeçamos seus mandamentos.

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