Filhos da livre, não da escrava.

A parashá desta semana (Vaierá – Gênesis 18:1-22:27) trata-se da porção onde encontramos o anúncio e o nascimento de Yitzhak (Isaque), além de outros eventos como a destruição de Sodoma e Gomorra, e a expulsão de Hagar e Ismael do acampamento de Abraão.

Sobre este último evento, apóstolo Paulo faz uma importante alegoria em Gálatas 4:21-31, que, infelizmente, tem sido muito mal interpretado pelo cristianismo.

A carta aos Gálatas foi escrita para combater o legalismo. É sempre bom definir o que é legalismo. Legalismo é o sistema em que a lei se torna o fim em si mesma. Ou seja, deve-se cumprir a lei porque é a lei. Desta forma a lei se torna uma imposição, e um peso para aqueles que estão debaixo dela.

Na verdade, a Torá não tem o fim (finalidade, objetivo) em si. O fim da Torá é Yeshua (Jesus), e a Salvação pela fé no Filho de Deus. Ao compreender os mandamentos do Eterno, obedecendo seus mandamentos, aprendemos muito sobre nós, nossos pecados, e nossa necessidade de remissão.

A Torá aponta para Yeshua, e a visão legalista sobre a Torá deturpa a nossa compreensão sobre Yeshua, sobre a Graça do Eterno e sua Salvação, e sobre a própria Torá. Por isso Paulo combateu tão duramente o legalismo na sua carta aos Gálatas.

E, na sua alegoria em Gálatas 4:21-31, vamos ter uma compreensão muito interessante sobre este tema.

“Porque está escrito que Abraão teve dois filhos, um da escrava, e outro da livre. Todavia, o que era da escrava nasceu segundo a carne, mas, o que era da livre, por promessa. O que se entende por alegoria; porque estas são as duas alianças; uma, do monte Sinai, gerando filhos para a servidão, que é Agar.” Gálatas 4:22-24.

Paulo usa Hagar e Sara como figuras das duas alianças, a aliança do Sinai, representada por Hagar, e a nova aliança, representada por Sara. Segundo Paulo, a primeira aliança gera filhos para a escravidão, enquanto que a nova aliança gera filhos para a liberdade.

Para entendermos o que Paulo está dizendo, precisamos compreender as bases das duas alianças. A primeira aliança, feita no Sinai, tinha por base Israel votando ser obediente à Torá, para ser então feito reino sacerdotal:

“Agora, pois, se diligentemente ouvirdes a minha voz e guardardes a minha aliança, então sereis a minha propriedade peculiar dentre todos os povos, porque toda a terra é minha. (...) Então todo o povo respondeu a uma voz, e disse: Tudo o que o SENHOR tem falado, faremos. E relatou Moisés ao SENHOR as palavras do povo.” Êxodo 19:5;8.

Infelizmente, Israel falhou pouco tempo depois de fazer o voto de cumprir toda a Palavra de Deus, no episódio do bezerro de ouro. Mesmo Israel falhando em seu voto, o Eterno ainda sustentou esta aliança, fazendo de Israel seu povo sacerdotal, pois esta aliança estava baseada na promessa feita a Abraão, de fazê-lo benção para todas as famílias da terra. E prometeu uma nova aliança, com uma base diferente:

“Mas esta é a aliança que farei com a casa de Israel depois daqueles dias, diz o SENHOR: Porei a minha lei no seu interior, e a escreverei no seu coração; e eu serei o seu Deus e eles serão o meu povo.” Jeremias 31:33.

A nova aliança não tem por base o esforço humano em cumprir o mandamento de Adonai, mas na ação sobrenatural do Eterno em escrever a sua Torá no coração e na mente do seu povo. Nas duas alianças a Torá tem um papel fundamental, mas há uma diferença principiológica. Na primeira aliança a Torá é imposta como obrigação, e na nova aliança a Torá é colocada no coração do servo de Deus.

Mas, se a primeira aliança foi feita sobre uma base frágil, e por isso mesmo se tornou falha e ineficaz, porque ela foi feita? O Eterno sempre teve por objetivo final a nova aliança, visto que a própria Torá já fala sobre a circuncisão do coração. Mas foi necessária essa aliança por um tempo, até que viesse o Messias, e estabelecesse a nova aliança.

Perceba que, até aqui, estamos falando de alianças, não há aqui, nem nas palavras de Paulo, nenhuma alusão à Torá. Pelo contrário, em ambas alianças a Torá é citada, e colocada em um papel de grande importância.

Ambas as alianças são feitas com Israel, e, em ambas as alianças, a Torá tem papel fundamental. Isso fere de morte o entendimento de parte do cristianismo que, com base nas palavras de Paulo, alegam o fim da Torá, e o fim de Israel como o povo escolhido do Eterno.

A diferença que Paulo apresenta em sua alegoria é que, se olharmos para a Torá como uma imposição, como regras que devem ser obedecidas por todos, e se julgarmos nosso próximo, sua salvação e santidade, pelas regras da Torá, então estamos agindo na primeira aliança. Estamos depositando nossa confiança em sermos aceitos por Deus nas nossas obras, e na nossa capacidade de obedecer. Assim como Hagar era escrava, os que agem na primeira aliança se veem escravos da Torá.

Mas, aqueles que se reconhecem pecadores, e confiam unicamente na expiação feita por Yeshua na cruz para serem aceitos por Deus, tem a Torá como instrução, e, conforme aprendem seus princípios, buscam colocá-los em prática, não confiando em seu esforço próprio, mas na santificação operada pelo Espírito de Deus, que habita em todo o que crê em Yeshua. O crente em Yeshua procura obedecer a Torá por entendimento e fé, não por imposição.

Yeshua nos contou uma parábola muito interessante que retrata bem o que dissemos até aqui. O filho pródigo pecou, falhou, arrependeu-se e retornou para a casa do Pai. Na casa do Pai pediu para ser feito seu servo, mas o Pai o restituiu à posição de filho. Mas, o filho mais velho, ao ver a festa que estava sendo feita para o filho pródigo, indignou-se, e em sua indignação vemos retratado o que o legalismo faz com nossa relação com Deus:

“Mas ele se indignou, e não queria entrar. E saindo o seu pai, rogava-lhe que entrasse com ele. Mas, respondendo ele, disse ao pai: Eis que te sirvo há tantos anos, sem nunca transgredir o teu mandamento, e nunca me deste um cabrito para alegrar-me com os meus amigos; vindo, porém, este teu filho, que desperdiçou os teus bens com as meretrizes, mataste-lhe o bezerro cevado. E ele lhe disse: Filho, tu sempre estás comigo, e todas as minhas coisas são tuas; mas era justo alegrarmo-nos e folgarmos, porque este teu irmão estava morto, e reviveu; e tinha-se perdido, e achou-se.” Lucas 15:28-32.

O legalismo levou o filho mais velho a servir seu pai como um escravo, sem nunca deleitar-se com a presença do pai. E o impediu de ver o milagre de salvação que estava sendo operado no seu irmão mais novo.

Que nunca nos permitamos ser ludibriados pelo legalismo, mas que reconheçamos sempre nossa dependência de Yeshua, e que nossa obediência seja sempre fruto do nosso amor a Deus, e da ação do seu Espírito em nós.

O Eterno nos abençoe!
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