Divórcio e segundo casamento.

O divórcio e o segundo casamento é uma prática recorrente em nossos dias. Em média, os casamentos duram no Brasil algo em torno de 15 anos. O lado mais triste dessa estatística é que grande parte desses divórcios e segundos casamentos acontecem justamente entre os cristãos evangélicos.

Quando olhamos para a Palavra de Deus vamos perceber que um dos sinais da volta de Cristo é justamente que nos últimos dias os homens se casariam e se dariam em casamentos. Essa expressão “casavam-se e davam-se em casamento” denota a banalização do casamento como princípio da instituição familiar.

“E, como aconteceu nos dias de Noé, assim será também nos dias do Filho do homem. Comiam, bebiam, casavam, e davam-se em casamento, até ao dia em que Noé entrou na arca, e veio o dilúvio, e os consumiu a todos.” Lucas 17:26-27

Infelizmente a igreja de Cristo não tem entendido corretamente o propósito de Deus no casamento, e nem as questões que envolvem o divórcio e o segundo casamento na bíblia. Muitos cristãos acreditam que Deus não se importará se você se divorciar e casar-se novamente porque afinal todos têm o direito de ser feliz.

Mas será que realmente Deus não se importa com essa postura?

Uma coisa é fato, e deve ser entendida de imediato: o divórcio é bíblico, a Lei faz menção ao divórcio e ao segundo casamento, porém o que as pessoas não entendem é em qual circunstância a Lei PERMITE o divórcio.

A Lei apresenta o divórcio como uma PERMISSÃO e não como uma ORDENANÇA. Ou seja, em determinada circunstância o divórcio pode ser uma opção.

A Lei diz o seguinte:

“Quando um homem tomar uma mulher e se casar com ela, então será que, se não achar graça em seus olhos, por nela encontrar coisa indecente, far-lhe-á uma carta de repúdio, e lha dará na sua mão, e a despedirá da sua casa.” Deuteronômio 24:1

No entanto, quando olhamos no original, a palavra “iervah” aqui traduzida por “coisa indecente” não aparece em nenhum outro lugar da Torá. Assim a interpretação do que seria exatamente essa “coisa indecente” ficou bem dificultosa.

Muitos rabinos tentaram interpretar esse texto ao longo dos anos, no primeiro século duas escolas rabínicas importantes se opuseram firmemente quanto a interpretação desse texto. A escola rabínica de Hillel interpretava de forma bem liberal o termo “coisa indecente”, dizendo que qualquer coisa que desagradasse ao marido poderia ser motivo para o divorcio. Já a escola de Shammai era mais conservadora, e entendia que a “coisa indecente” deveria ser entendida por “fornicação” ou relação sexual antes do casamento.

Foi nesse contexto em que alguns fariseus chegaram até Jesus para o questionarem quanto a questão do divórcio:

“Então chegaram ao pé dele os fariseus, tentando-o, e dizendo-lhe: É lícito ao homem repudiar sua mulher por qualquer motivo?” Mateus 19:3

Perceba que a pergunta dos fariseus já tinha uma resposta pronta, eles perguntaram a Jesus se era lícito “repudiar por qualquer motivo” como ensinava a escola de Hillel. Os fariseus na verdade esperavam que Jesus contrariasse o ancião Hillel para terem do que o acusarem, já que Hillel era um rabino muito respeitado por todos, e até hoje nos meios judaicos Hillel é conhecido como “O Ancião”.

No entanto, em um primeiro momento, Jesus contraria as duas escolas e volta ao princípio, resgatando o propósito divino no casamento, dizendo:

“Ele, porém, respondendo, disse-lhes: Não tendes lido que aquele que os fez no princípio macho e fêmea os fez, e disse: Portanto, deixará o homem pai e mãe, e se unirá a sua mulher, e serão dois numa só carne? Assim não são mais dois, mas uma só carne. Portanto, o que Deus ajuntou não o separe o homem.” Mateus 19:4-6

Em outras palavras Jesus estava dizendo: O que vocês estão preocupados com a permissão para o divórcio se a vontade de Deus é que o casal não se divorcie?

Jesus resgata o principio da vontade de Deus para o casamento, ser único para toda a vida. E essa vontade de Deus é tão latente que Ele mesmo usa o casamento como alegoria para a nossa aliança com Ele.

Porém os fariseus retrucam o porquê então de na Lei haver a permissão para o divórcio se a vontade de Deus é que claramente os dois sejam uma só carne:

“Disseram-lhe eles: Então, por que mandou Moisés dar-lhe carta de divórcio, e repudiá-la?” Mateus 19:7

A resposta de Jesus é ainda mais perturbadora:

“Disse-lhes ele: Moisés, por causa da dureza dos vossos corações, vos permitiu repudiar vossas mulheres; mas ao princípio não foi assim.” Mateus 19:8

Deus tem permitido em sua Lei que o divórcio acontecesse por causa da nossa dureza, ou da nossa incapacidade de sentir em nosso coração a vontade de Deus. Assim a permissão dada por Deus na Lei é um ato de misericórdia para conosco, pois, por termos nosso coração endurecido pelo pecado, nós desobedecemos à vontade de Deus.

Assim o mandamento não é uma ordem para que ocorra o divórcio, mas uma permissão, que na verdade é vergonhosa para quem usufrui dessa permissão, pois revela a dureza do coração, e não a submissão à vontade de Deus.

Assim Jesus explica o porquê o mandamento existe, mas agora ele vai especificar em qual circunstância o mandamento permite o divórcio, e ele complementa:

“Eu vos digo, porém, que qualquer que repudiar sua mulher, não sendo por causa de fornicação, e casar com outra, comete adultério; e o que casar com a repudiada também comete adultério.” Mateus 19:9

A palavra no original, traduzida por “fornicação” neste texto, é a palavra “pornéia” que significa “infidelidade sexual” enquanto que a palavra traduzida por “adultério” é a palavra “moicheia” que significa exatamente “adultério”.

Por isso cabe uma reflexão: o que diferencia a “pornéia” da “moicheia”? A “porneia” ou a “fornicação” é a relação sexual que acontece antes do casamento, enquanto que a “moicheia” é a relação sexual fora do casamento, de um individuo casado.

Ou seja, “moicheia”ou “adultério” é quando alguém casado tem relações sexuais com outra pessoa que não é seu cônjuge, enquanto que “pornéia” ou “fornicação” é a relação sexual entre solteiros.

Agora pra entendermos melhor o que Jesus estava dizendo é necessário entendermos como funcionava o casamento entre o povo judeu, e vamos usar para isso o caso de Maria e José.

A bíblia diz o seguinte:

“Ora, o nascimento de Jesus Cristo foi assim: Que estando Maria, sua mãe, desposada com José, antes de se ajuntarem, achou-se ter concebido do Espírito Santo.” Mateus 1:18

Perceba que Maria já estava “desposada” ou “casada” com José, porém eles ainda não tinham se “ajuntado”.

Na cultura judaica não havia o “noivado” propriamente dito, o que acontecia era que o “noivo” desposava (casava-se) com sua “noiva” e ia fazer os preparativos para o casamento, ou seja, iria providenciar casa, dote, etc. Quando estava tudo pronto o noivo voltava para levar a sua esposa, e ajuntar-se com ela.

O noivo ao desposar sua noiva assinava um contrato junto ao pai da noiva, onde se responsabilizava em providenciar casa e sustento para sua esposa, e o pai da noiva se comprometia em manter sua filha virgem e prepará-la para assumir as obrigações de um lar.

Com esse contrato assinado, o noivo saía para ir preparar casa e juntar suas economias e dentro de um prazo de no máximo dois anos, ele regressaria para levar sua esposa. No ato da assinatura do contrato a noiva já mudava seus trajes e passava a utilizar o véu, símbolo de casamento.

Assim o compromisso que existia não era um simples noivado como acontece em nossa cultura, mas de casamento mesmo, porém até que o noivo regressasse, não havia nenhum tipo de contato físico entre eles.

Assim a relação sexual entre o casal só acontecia após este momento. Até então eles estavam casados, mas não estavam coabitando.

É muito evidente que Cristo usou essa condição cultural do povo de Israel para nos ensinar sobre a nossa aliança com Ele. Nós somos a “noiva” de Cristo. Ele nos desposou, comprando-nos para si com seu próprio sangue, mas disse que iria ao pai “preparar moradas” e que quando tivesse tudo pronto ele voltaria para nos buscar, para que onde Ele estiver, estivéssemos nós também.

“E quando eu for, e vos preparar lugar, virei outra vez, e vos levarei para mim mesmo, para que onde eu estiver estejais vós também.” João 14:3

Temos uma aliança com Cristo, uma aliança eterna e inquebrável (da parte dEle). E essa aliança é alegorizada no casamento judaico.

Mas voltando a questão do divórcio, combinando o texto de Deuteronômio 24:1-4 com a explicação de Mateus 19:9, o que vamos entender é que, o único momento em que a Lei poderia ser aplicada era entre o momento do “desposar” até antes do “coabitar”, pois se a fornicação fosse descoberta antes do desposar, não haveria nenhuma necessidade de carta de divórcio, pois ainda não havia casamento, e se a fornicação acontecesse após o coabitar, não seria fornicação, mas adultério.

Então o que a Lei está permitindo é que, enquanto o esposo estivesse ainda preparando-se para coabitar, se fosse descoberto algo indecente na esposa (fornicação), o esposo poderia dar carta de divórcio.

Olhando agora para o casal Maria e José, vemos que, quando José descobriu que Maria estava grávida, ela já era esposa de José, porém eles ainda não tinham se juntado, ou seja, José ainda estava preparando as coisas necessárias para que Maria fosse coabitar com ele, até este momento José não sabia que Maria estava grávida pelo Espírito Santo.

Mas algo interessante aconteceu neste momento, ao invés de pensar em dar a carta de divórcio a Maria, como a Lei permitia, ele pensou em abandoná-la secretamente, e a bíblia diz que ele pensou nisto porque era justo.

“Então José, seu marido, como era justo, e a não queria infamar, intentou deixá-la secretamente.” Mateus 1:19

Vamos entender o que se passou na mente de José neste momento para entendermos o porquê a bíblia diz que ele era justo.

Se José usasse da permissão da Lei, dando carta de divórcio, Maria seria exposta publicamente como alguém que se prostituiu com outro que não era o seu noivo.

Caso José se afastasse secretamente, ele poderia dar espaço para o verdadeiro “pai” da criança assumir Maria e seu filho, porém, ele seria taxado como aquele que “engravidou” uma moça virgem antes da hora, e fugiu.

Lembrando que até este momento o anjo não o havia visitado para lhe informar que o que estava sendo gerado em Maria era fruto do Espírito Santo.

Nestas circunstâncias, José preferiria levar a culpa de algo que não fez, do que expor Maria a uma situação humilhante e degradante. Perceba que José não tinha a “dureza do coração” relatada por Jesus em Mateus 19:9, e exatamente por preferir carregar a vergonha a procurar a sua própria justiça, que José é chamado de justo. E sem dúvida alguma essa posição de José demonstrava o quanto ele amava Maria.

Quando o anjo aparece a José, e ele entende que, o que estava acontecendo com Maria era mover de Deus, ele imediatamente aceita Maria como sua mulher, mas não a conheceu até que Jesus nascesse.

“E, projetando ele isto, eis que em sonho lhe apareceu um anjo do Senhor, dizendo: José, filho de Davi, não temas receber a Maria, tua mulher, porque o que nela está gerado é do Espírito Santo; e dará à luz um filho e chamarás o seu nome JESUS; porque ele salvará o seu povo dos seus pecados.

Tudo isto aconteceu para que se cumprisse o que foi dito da parte do Senhor, pelo profeta, que diz; eis que a virgem conceberá, e dará à luz um filho, E chamá-lo-ão pelo nome de EMANUEL, Que traduzido é: Deus conosco.

E José, despertando do sono, fez como o anjo do Senhor lhe ordenara, e recebeu a sua mulher; e não a conheceu até que deu à luz seu filho, o primogênito; e pôs-lhe por nome Jesus.” Mateus 1:20-25

No entanto essa situação de uma gravidez antes do coabitar foi um estigma para a família de Jesus, tanto que anos mais tarde os judeus acusaram Jesus falsamente de ser filho de fornicação.

“Vós fazeis as obras de vosso pai. Disseram-lhe, pois: Nós não somos nascidos de fornicação; temos um Pai, que é Deus.” João 8:41

Mas voltando a questão do divórcio, o que podemos ver é que, a permissão para o divórcio é dada unicamente em uma circunstância que, em nossa cultura não é praticada, portanto, não se aplica aos nossos dias.

Mas e os casos em que é impossível a convivência entre o casal, ou até mesmo onde a integridade física de um cônjuge está em risco?

Paulo dá uma orientação para esses casos:

“Todavia, aos casados mando, não eu mas o Senhor, que a mulher não se aparte do marido. Se, porém, se apartar, que fique sem casar, ou que se reconcilie com o marido; e que o marido não deixe a mulher.” 1 Coríntios 7:10-11

Assim existem casos em que a separação do casal é inevitável, pelas circunstâncias em que a própria integridade física do cônjuge possa estar em risco, mas essa separação não é um divórcio, pois não abre possibilidade para um segundo casamento. Muito pelo contrario, a única possibilidade que pode ser estudada é a da reconciliação.

Assim o que vemos é que o divórcio e o segundo casamento não possui nenhum amparo nas escrituras, a permissão que é dada no mandamento é dado em uma circunstância específica que não existe mais em nosso contexto cultural, e o propósito do casamento é a unidade até que a morte separe.

Mas se mesmo assim o cristão insiste em procurar o segundo casamento?

É importante atentar para as palavras de Jesus, pois ele diz:

“Eu vos digo, porém, que qualquer que repudiar sua mulher, não sendo por causa de fornicação, e casar com outra, comete adultério; e o que casar com a repudiada também comete adultério.” Mateus 19:9

O segundo casamento é visto aos olhos de Deus como ADULTÉRIO!

Talvez em nossos dias essa palavra tenha perdido muito de sua força e expressão, visto sermos uma geração adúltera em todos os sentidos. No sentido da liberalidade e promiscuidade sexual, no sentido de que nossa geração é fraudulenta e falsa. Assim, em todos os sentidos que a palavra ADULTÉRIO pode ser aplicada, a nossa geração é ávida por praticá-lo.

No entanto, quando olhamos para a bíblia, vamos ver que Deus olha com extremo repúdio o pecado de adultério, comparando-o ao pecado de idolatria.

Na Lei vamos perceber que alguns pecados eram dignos de morte: a blasfêmia, a idolatria, a rebeldia contra pais, o assassinato e o adultério.

A Lei classifica esses pecados como dignos de morte para nos ensinar o quão vil é diante dos olhos de Deus os que tais coisas praticam. Temos também, corroborando com a Lei, várias passagens do Novo Testamento que classificam os ADÚLTEROS como dignos do inferno:

“Venerado seja entre todos o matrimônio e o leito sem mácula; porém, aos que se dão à prostituição, e aos adúlteros, Deus os julgará.” Hebreus 13:4

“Não erreis: nem os devassos, nem os idólatras, nem os adúlteros, nem os efeminados, nem os sodomitas, nem os ladrões, nem os avarentos, nem os bêbados, nem os maldizentes, nem os roubadores herdarão o reino de Deus.” 1 Coríntios 6:10

“Fora ficam os cães, os que praticam feitiçaria, os que cometem imoralidades sexuais, os assassinos, os idólatras e todos os que amam e praticam a mentira.” Apocalipse 22:15

Portanto vemos que o adultério é um grave pecado para que o cristão insista em querer praticá-lo.

Mas e aqueles que vieram a Cristo já no segundo casamento?

Infelizmente, enquanto longe das Leis de Deus, cometemos vários erros, pecados, e esses pecados nos trazem consequências. Em Cristo podemos ter o perdão de todos os nossos pecados, através do arrependimento, mas as consequências dos erros não serão de todo removidas.

O importante é que nossa conversão a Cristo resume-se em nossa morte para o mundo e para as práticas comuns do mundo, e uma nova vida com Cristo, em obediência aos mandamentos.

As atitudes erradas que cometemos no passado não podem ser desfeitas, mas é importante que, a partir da conversão, o cristão busque viver em conformidade com a Palavra de Deus.

Portanto se alguém veio para Cristo já no seu segundo casamento, fique como está, e honre a partir de agora seu matrimônio. Mas se o individuo encontra-se divorciado de sua esposa, e ainda não contraiu um segundo matrimônio, creio que as palavras de Paulo devem ser aplicadas:

“Todavia, aos casados mando, não eu mas o Senhor, que a mulher não se aparte do marido. Se, porém, se apartar, que fique sem casar, ou que se reconcilie com o marido; e que o marido não deixe a mulher.” 1 Coríntios 7:10-11

Mas aqueles que são solteiros, que avaliem com maior responsabilidade o que é o casamento, e quais são as suas implicações, para não errar, e para que o seu casamento seja de fato bênção de Deus na sua vida.